16 agosto 2011

Todos os homens sao mortais

- pensa realmente que não morrerá nunca?
- mesmo quando quero morrer não posso - disse ele
- ah! se eu acreditasse ser imortal!
- então?
- o mundo seria meu
- também pensei isso. há muito tempo
- porque não pensa mais?
- voce não pode imaginar isto: estarei aqui ainda, estarei aqui sempre!
...
- vivo e não tenho vida. não morrerei nunca e não tenho futuro. não sou ninguém. não tenho história nem fisionomia.
- tem - consolou ela docemente - eu o vejo.
- você me vê
- se ao menos a gente pudesse não ser absolutamente nada. mas há sempre outras pessoas na terra e elas nos vêem. Falam e não podemos deixar de ouvi-las, e respondemos, e recomeçamos a viver sabendo que não existimos. não tem fim.
-mas você existe
- existo para você neste instante. e você, você existe?
- naturalmente. como você.
ela pegou-lhe o braço:
- não sente minha mãe sobre seu braço?
ele olhou a mão:
- a mão sim, mas que significa isso?
- é minha mão
- sua mão
- seria preciso que me amasse e que eu a amasse. então você estaria onde você está; sei que sua boca existe - disse subitamente. seus lábios esmagaram-se contra os de Régine; ela fechou os olhos. a noite eclodira; já tinha começado há séculos e não acabaria mais. do fundo do tempo, um desejo ardente, selvagem, viera pousar-se na sua boca e ela entregara-se a esse beijo. o beijo de um louco, num quarto com cheiro de amoníaco.